Opinião
Texto de Carlos Vieira e Castro
Marcelo Rebelo de Sousa tem razão: anda para aí um cheiro a PREC no
ar… Um cheiro quente que parece trazido pelo vento Suão que vem do
Norte de África. Lá, tudo parecia imutável e os ditadores
sentiam-se seguros com o apoio das “democracias” ocidentais, em
troca do petróleo e do policiamento do Mediterrâneo contra os
migrantes africanos. Aqui, pelo nosso rectângulo, também tudo
parecia controlado pelas elites corruptas repartidas pelos partidos
do “arco do poder”. O “rotativismo” simulava “o fim da
História”. Até que alguém gritou “O Rei vai nu!” e toda a
gente viu que a nossa democracia pouco mais é do que um regime de
partido único com duas cabeças. O grito que tanto incomodou os
ouvidos sensíveis dos serventuários do regime foi a moção de
censura do Bloco de Esquerda. O PSD apressou-se a garantir que
estaria do lado do governo do PS. Um dos seus militantes mais
destacados, Pacheco Pereira, defendeu que Passos Coelho nunca poderá
votar uma moção contra Sócrates, dado que está a governar
juntamente com ele.
Surgiu então, um grito ainda mais amplificado: o do movimento da
Geração à Rasca que agendou manifestações no próximo Sábado,
dia 12 de Março, em Lisboa, Porto e Viseu. A onda tem vindo a
crescer de tal maneira nas redes sociais, que a extrema-direita
tentou surfá-la, procurando lançar a confusão e direccionando o
protesto contra toda a classe política e todos os partidos, o que
obrigou os signatários do Manifesto da Geração à Rasca a fazer o
seguinte esclarecimento:
“Reafirmamos a total independência do protesto face a qualquer
estrutura ou movimento de cariz partidário, político ou ideológico.
Este é um protesto: Apartidário, aberto a todos os partidos e a
quem não tem preferência partidária; Laico, aberto a todas as
religiões e a quem não tem religião; e Pacífico! Nunca foi
enviada qualquer lista de reivindicações. O manifesto é o único
documento associado ao protesto”. E é o Manifesto da Geração à
Rasca que nos diz quem é que se sente identificado com este
protesto: “Nós, desempregados, “quinhentoseuristas” e outros
mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a
prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores
intermitentes, estagiários, bolseiros, trabalhadores-estudantes,
estudantes, mães, pais e filhos de Portugal.
Nós, que até agora
compactuámos com esta condição, estamos aqui, hoje, para dar o
nosso contributo no sentido de desencadear uma mudança qualitativa
do país”.
Se a canção dos Deolinda, “Parva que sou”, incomodou muita
gente (até Mariano Gago a acusou de fazer a apologia do abandono
escolar), a vitória da canção “A luta é alegria” de Gel e
Falâncio, incomodou muito mais. Mas o povo que votou neste hino do
descontentamento nacional não foi só a geração desemprecariada,
foram os pais que viram cortados os salários, os abonos de família,
as reformas sociais, o poder de compra e a qualidade de vida. Todos
os que preferem a alegria e o inconformismo à contrafacção
ignorante e descaracterizadora de uma Europa triste de canções sem
alma, (des)afinadas pelos mercados.
Na passada segunda-feira, José Sócrates veio a Viseu apresentar a
sua moção aos militantes do PS, quando um grupo de jovens da
“Geração à Rasca” entrou na sala e pediu para falar. Foram
expulsos e agredidos, enquanto Sócrates dizia para as câmaras de TV
que estavam convidados para jantar e “é Carnaval ninguém leva a
mal”. Nós, todas as gerações à rasca, levamos a mal este
“baile de Carnaval” em que PS e PSD, mascarados de “governo”
e “oposição”, dançam agarradinhos, calcando toda a gente, e
não nos deixaremos iludir com a tradicional troca de máscaras, com
que costumam fugir às suas responsabilidades. Não adianta gritar,
como Cavaco, “agarra que é ladrão!”, porque “tão ladrão é
o que vai à horta como o que fica à porta”.
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