2000 ANOS DEPOIS, AINDA HÁ MENINOS A NASCER (E A VIVER!) EM ESTÁBULOS
30-Dez-2008

olho_vivo.jpg Dois mil depois ainda há meninos que nascem em estábulos, vítimas de desprezo e preconceitos. É o caso do David Joel que tem 4 anos e desde que nasceu continua a viver com os pais num tugúrio que já foi estábulo (ainda lá existem as argolas que serviam para prender o burro). Trata-se do rés-do-chão de uma casa de habitação em pedra, onde, segundo a arquitectura tradicional, ficava a loja dos animais. A avó vive numa outra loja contígua. A “cozinha” foi improvisada no pátio, debaixo da varanda, exposta ao frio e à chuva. No centro da cidade de Viseu, onde, segundo a propaganda autárquica, “dá gosto viver”.

A insalubridade daquele alojamento tem provocado bronquiolite ao Joel. O pai é feirante e paga impostos, mas a crise que assola o comércio em geral cada vez agrava mais as dificuldades com que a família vive. O Joel sofre ainda de estrabismo, o que o obriga a usar óculos, mas não teve direito a qualquer comparticipação por parte do Estado nos 200 euros que os pais tiveram que dar recentemente por novos óculos.

Uma técnica de habitação social da Câmara Municipal de Viseu, contactada, há cerca de dois anos, pela nossa Associação caracterizou o alojamento precisamente como “uma loja de animais”, mas até agora a Câmara Municipal de Viseu não resolveu o problema. Há poucas semanas, duas assistentes sociais da Segurança Social de Viseu foram visitar a “casa” do Joel, na Travessa do Matadouro. Parece que ficaram condoídas com a situação, mas a verdade é que, até ao momento, nem a Segurança Social (que remete para a autarquia a responsabilidade pela habitação social) nem os autarcas da Câmara Municipal (que dizem que as casas que têm vagas no bairro social da Balsa, onde residem os outros avós do Joel, são só para vender) se preocuparam em resolver o problema. De referir que a autarquia dispõe de mais dois bairros sociais: o Bairro da Quinta da Pomba, onde não existe nenhuma família de etnia cigana e o Bairro Social de Paradinha, perto de uma povoação dos arredores de Viseu que, pelo contrário, é um autêntico gueto de ciganos. À família do Joel não lhe agradaria ser realojada num gueto, dado sentirem-se perfeitamente integrados na comunidade.

O menino Jesus ainda foi aquecido pelo bafo da vaca e do burro, mas neste presépio viseense de nada vale substituir aqueles animais pela Segurança Social e pelo presidente da autarquia. Dali nem um bafo sai.

Nem o Ano Europeu do Diálogo Intercultural, nem as comemorações recentes dos 60º Aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos serviram para sensibilizar quem tem obrigações constitucionais para resolver este problema.

O menino Jesus foi perseguido e discriminado por ser hebreu. O Joel é discriminado e excluído por ser de etnia cigana, embora isso não venha a figurar no seu bilhete de identidade de cidadão português.


Viseu, 25 de Dezembro de 2008


Pel’O Núcleo de Viseu da OLHO VIVO – Associação para a Defesa do Património, Ambiente e Direitos Humanos,


Carlos Vieira e Castro


(telem. 914197747)