PEC: POBRES ESMAGADOS PELA CRISE!
30-Mar-2010
    Opinião
Texto de Carlos Vieira
 
carlosvieira.jpgA conhecida palavra de ordem que a UDP criou nos anos oitenta, “Os ricos que paguem a crise!”,  ganha uma nova actualidade com o PEC – Programa de Estabilidade e Crescimento que, ao que tudo indica, será aprovado hoje na Assembleia da República, com os votos a favor do PS e a abstenção do PSD. Com efeito, o PEC é o mais violento ataque aos pobres e à classe média desde o 25 de Abril. O PS manda às urtigas o seu próprio programa eleitoral, fazendo, agora, exactamente, o contrário daquilo que prometera aos portugueses há apenas meio ano.
As medidas mais gravosas para os mais pobres (e é bom lembrar que, em Portugal, a chamada “classe média baixa” está cada vez mais proletarizada)   são as que determinam reduções nas despesas sociais, a começar pelas não contributivas,  como seja o congelamento até 2013 do abono de família e da acção social escolar, enquanto se reduz aos verbas do complemento solidário para idosos, subsídio social de desemprego e o rendimento social de inserção. Cortes nas despesas de saúde no valor de 715 milhões de euros, com o governo a referir mudanças a nível de meios complementares de diagnóstico, fazem prever a degradação do Serviço Nacional de Saúde. Por outro lado, ao reduzir as deduções das despesas de educação, habitação e saúde no IRS, o Governo está também, na prática, a aumentar os impostos.
       As mais valias mobiliárias superiores a 500 euros passam a ser tributadas à taxa de 20% (note-se que em França as mais valias bolsistas pagam 26% de imposto). Mas o governo não incluiu a proposta no Orçamento e adiou a sua aplicação para um futuro indefinido, quando tiver passado o perigo de recessão. Oito deputados do PS, entre os quais, Vera Jardim, Ana Catarina Mendes e João Galamba, entregaram uma declaração de voto a contestar esta dualidade de critérios: mão pesada para os mais pobres e tolerância máxima para os mais ricos.
       Aliás, este PEC já provocou mais  algumas reacções no interior do próprio PS. Pedro Adão e Silva e Paulo Pedrosos mostraram-se chocados com a factura enviada aos  mais pobres. Mário Soares, Ana Gomes e João Cravinho criticaram as privatizações anunciadas da REN, TAP, GALP, EDP e até dos CTT. João Cravinho lamentou que até Paulo Portas tenha dado “lições de esquerda a Sócrates”, ao chamar-lhe a atenção para o perigo de se privatizarem empresas que vão agravar situações monopolistas, e considerou que “o PS entrou numa deriva à direita da qual vai ser muito difícil regressar sem que haja grandes alterações na direcção”. Também Manuel Alegre foi contundente, não se deixando condicionar pela indecisão de Sócrates em apoiar a sua candidatura à presidência da República: “Não é moralmente aceitável que enquanto se impõe o congelamento de salários na função pública haja gestores de empresas com capitais públicos que se atribuem milhões de euros de prémios e benefício. É um escândalo para a saúde da República.”
       E, no entanto, não foi por falta de alternativas que Sócrates enveredou por este caminho PECaminoso. Tanto o PCP como o Bloco de Esquerda apresentaram propostas para reduzir ainda mais o défice, promover o desenvolvimento e relançar a economia. Uma das 15 medidas apresentadas pelo BE para uma “economia decente”, para além da taxação de 20%, com aplicação imediata, das mais-valias bolsistas,  da taxação de 25% sobre todas as transferências para offshores, e ainda o limite das isenções e benefícios que permitem que os bancos paguem merca de metade de IRC que paga uma qualquer mercearia,  era o investimento de cinco mil milhões de euros, ao longo de três anos, na reabilitação de casas degradadas e desocupadas, para recuperar 200 mil casas, criando 60 mil postos de trabalho directos na industria de construção civil e relançar a economia. Assim, resolver-se-ia, ainda, um problema dramático que afecta muitos dos centros históricos das nossas cidades (de Lisboa ao Porto, passando por Viseu), já que as autarquias se têm mostrado incapazes de impedir que tantas casas em ruínas tombem nas nossas cabeças.

Carlos Vieira e Castro