BE avança com projecto para impedir que doentes paguem transporte dos bombeiros
28-Jan-2011
jsemedo.jpgO Bloco de Esquerda entregou na Assembleia da República um projecto de resolução sobre o transporte de doentes não urgentes pelos bombeiros, com o objectivo de anular o despacho do Governo que determina, salvo para algumas doenças crónicas, que os doentes que ganhem mais de 419 euros por mês tenham de passar a pagar a deslocação.

O partido pretende “suspender o critério de insuficiência económica no acesso ao transporte pago de doentes não urgentes”, por considerar que “fazer depender o acesso ao transporte pago à comprovação de insuficiência económica não só desrespeita os cidadãos em situação de debilidade e fragilidade, como não tem em consideração as desigualdades geográficas e de carência de mobilidade dos cidadãos, sem esquecer a natureza dinâmica do estado de saúde de alguns doentes”.


Em causa está o Despacho 19264/2010  do Ministério da Saúde, publicado a 29 de Dezembro, que determina que o Estado só assumirá o pagamento do transporte em ambulância quando o utente comprove com justificação médica e insuficiência económica. O problema já motivou uma posição da Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP), que decidiu convocar um congresso extraordinário. A LBP, após reunião com o secretário de Estado da Saúde, já pediu a anulação do decreto.

Os bloquistas entendem, por seu lado, que “excluir do acesso ao transporte pago todos cidadãos com rendimentos superiores ao salário mínimo nacional não tem em conta os tratamentos a que os doentes têm de se submeter, deslocações a efectuar, serviços públicos ao seu alcance, etc, e é reveladora da desresponsabilização do Estado, enquanto actor social, na implementação de políticas que tenham como objectivo maximizar o bem-estar das populações”.

Auditoria detecta irregularidades
A par com o projecto, o BE deu também entrada com um requerimento dirigido ao Ministério da Saúde, onde solicita acesso à auditoria encomendada pela Administração Central do Sistema de Saúde sobre o transporte de doentes não urgentes e onde terão sido detectadas algumas irregularidades que estão na origem das alterações às regras feitas pela tutela. A auditoria, já divulgada pelo PÚBLICO, detectou inúmeros casos em que foram feitos pagamentos sem a justificação médica, facturação de viagens fictícias, pagamentos em excesso e reembolsos sem o respectivo comprovativo. Permitiu ainda perceber que o preço pago por quilómetro variava nas cinco administrações regionais de saúde e que o transporte prescrito em modalidade de “grupo” surgia várias vezes facturado como transporte “individual”.

No requerimento, o deputado João Semedo destaca que este tipo de transporte de doentes tem “grande relevância” e que quando surgiu foi destacado como “inegável o interesse de a comunidade em geral e de os doentes em particular disporem de uma rede de transportes de saúde que lhes garanta cabal satisfação das suas necessidades nesta matéria”. O parlamentar refere também que a Lei de Bases da Saúde sublinha que é fundamental “obter igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua condição económica e onde quer que vivam” para garantir a equidade. E lembra que os originadores da procura de transporte não urgente são essencialmente as instituições de saúde, pelo que se pressupõe a justificação clínica.

Esta semana, no âmbito da comissão parlamentar de Saúde, a ministra Ana Jorge esclareceu que o despacho que determina que os doentes com rendimentos superiores a 419 euros têm de pagar o transporte dos bombeiros ainda não está, afinal, em vigor. A titular da pasta da Saúde explicou que ainda não é possível fazer a avaliação da condição económica dos doentes, em resposta a uma pergunta do deputado comunista Bernardino Soares, que alertou que “milhares de doentes” estão a faltar a tratamentos e consultas por falta de transporte e uma pergunta da social-democrata Clara Carneiro, que pediu uma “imediata revogação” do despacho de Dezembro.

Independentemente das condições financeiras, o Ministério da Saúde prevê algumas excepções ao pagamento, nomeadamente no caso de doentes com cancro, que façam hemodiálise, que tenham tido alguns transplante ou que tenham perturbações visuais graves.

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