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Sócrates e Durão: A Bem da Nação! |
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07-Mai-2009 |
Apesar de surpreso pela notícia do apoio de José Sócrates a Durão Barroso, o que mais me chocou não foi o facto de o Primeiro-Ministro apoiar a reeleição do actual presidente da Comissão Europeia, mas sim os argumentos nacionalistas utilizados para sustentar essa posição. Sócrates no parlamento não disse uma palavra acerca do mérito de Durão Barroso, do trabalho desenvolvido pela comissão, da capacidade de liderança, dos projectos para o futuro. Pelo contrário, defendeu-se dos ataques da oposição com um discurso patriótico do "se é português é bom", o que revela um total desrespeito pela visão supranacional que deveria orientar os discursos dos líderes europeus nas discussões acerca do projecto europeu e que é típico do provincianismo que muitas vezes caracteriza muitos dos dirigentes da pátria. Claro que também não faltaram as velhas acusações de sectarismo da esquerda, mas onde é que encaixamos então Mário Soares, José Manuel Fernandes ou Vasco Pulido Valente que condenaram em uníssono esta "saloiice" e com quem eu me vi obrigado a concordar?
Eu sei que hoje em dia os princípios contam pouco, mas então fica a
pergunta: e se fosse Mário Machado? Votaria Sócrates na sua eleição
contra um qualquer estrangeiro independentemente da ideologia? Será que
ser português é o critério mais importante quando confrontado com um
estrangeiro? Já nos tínhamos dado conta que isso acontece
invariavelmente nos relatos radiofónicos dos jogos da UEFA, do Euro ou
do Mundial sempre que equipas nacionais jogam contra estrangeiras, mas
querer aplicar a mesma regra à União Europeia para além de ridículo é
perigoso, porque faz despertar sentimentos que quando levados ao
exagero resultam invariavelmente em guerra, e a Europa já testemunhou
duas guerras mundiais graças ao nacionalismo exacerbado, e ainda há bem
pouco tempo a Jugoslávia se fragmentou através de uma guerra brutal que
derivou da mesma problemática. Mas não é isso que aqui está em causa,
aquilo que se pergunta é: para José Sócrates, em que lugar encaixa o
critério nacional? Acima do mérito, da capacidade, da visão, do
projecto? Até que ponto o nacionalismo é mais importante que qualquer
outro critério para o nosso primeiro-ministro?
É claro que houve logo um coro de aplausos à coragem de Sócrates. Por
exemplo, o director do Sol, José Saraiva, argumenta com o facto de
ficarmos contentes sempre que o Ronaldo marca ou ganha um jogo! Eu acho
mas é inacreditável como é que se pode comparar o sucesso ou insucesso
de Ronaldo com o destino e o futuro da Europa! Sim, porque é disso que
se trata. É que eu não vislumbro até que ponto influenciará a minha
vida uma derrota ou vitória de Ronaldo! Mas tenho a certeza de que a
eleição do presidente da comissão europeia terá uma relação directa no
que serão os próximos 5 anos para os europeus, porque dele dependerão
muitas das directivas que influirão directamente sobre as nossas vidas,
dos portugueses e dos europeus, seja lá qual for a distinção. Porque
esse patriotismo da bandeira na janela ou à varanda e em que depois no
dia das eleições se fica em casa a mim não me diz rigorosamente nada.
Isso não é patriotismo, é provincianismo.
A verdade é que a União Europeia não pode viver refém desta mesquinhez
nacional, não pode ser uma soma de nacionalismos, de Portugal à
Polónia, da Alemanha à França, correndo o risco de implodir quando
todos os líderes decidirem em função da sua própria nacionalidade.
Aproveito também a oportunidade para indagar então até que ponto chega
o amor à nossa terra. Nas eleições legislativas o critério então dos
habitantes de Castelo Branco será votar Sócrates porque é da cidade.
Nas eleições autárquicas votaremos no candidato da nossa freguesia.
Para a junta o critério seria votar na pessoa da minha aldeia. No
condomínio votarei naquele que for do meu andar. É esta a noção que o
PS tem da política de proximidade. Está bem que até pode ser para
alguns um bom critério, mas não pode ser de todo um preceito que reja
as decisões de um primeiro-ministro. Isto nem num país do faz de
contas. É a velha discussão em torno das capelas e das capelinhas e o
nacional-umbiguismo ou nacional-amiguismo no seu esplendor máximo.
Claro que todos quereríamos um TGV à porta, um aeroporto na cidade, uma
auto-estrada que desembocasse no nosso bairro. Mas não é por amarmos a
nossa terra e termos poder para o fazer que agora desataremos a
construir elefantes brancos só porque é bom para a nossa cidade
independentemente de ser mau para o país. O mesmo se aplica à escolha
de Durão Barroso. Não é por ser prestigiante para Portugal que iremos
pôr em causa o futuro da União. Barroso foi o criado de serviço na mais
vergonhosa cimeira da nossa democracia e que originou a mais vergonhosa
guerra das últimas décadas, caracterizada pela mentira e motivada pela
ganância de Bush e seus amigos. Barroso é o rosto ultrapassado do
neo-liberalismo fraudulento que nos colocou perante a mais grave crise
económico-financeira desde a 2ª Guerra Mundial. Barroso foi o homem que
deixou Santana como herança, foi o homem que na última cimeira do G-20
não se viu. Não se deverá o protagonismo de Sarkozy, Brown, Merkel e
Berlusconi à falta de carisma e liderança do presidente da Comissão
Europeia? E de que modo isso se traduz em prestígio para Portugal? Só
se for um prestígio à prestige! Um prestígio contaminado pelo petróleo.
Talvez este apoio se deva exactamente ao facto de Barroso ter oferecido
uma oportunidade única a Sócrates de obter a maioria absoluta, isto
porque ninguém de bom senso vislumbrava alguma espécie de futuro para a
dupla Santana/Portas... E até desconfio que o apoio incondicional ao
tratado de Lisboa, esquecendo o tão prometido referendo à vontade
popular, se deve somente e tão só a isso mesmo, ao nome: Lisboa. Já
imaginaram nos livros de história, a par do Tratado de Roma e dos
fundadores da comunidade europeia, o Tratado de Lisboa e Sócrates como
mentor da nova Europa? Eu não, mas aposto que Sócrates tem vindo a
sonhar com isso, apesar do não irlandês e as reticências checas terem
transformado aquilo que parecia um belo sonho num pesadelo...
Agora o nacionalismo discute-se internamente através da necessidade de
um Bloco Central, a bem da nação. Então estes senhores repartiram o
poder nos últimos 33 anos, acusam-se mutuamente sobre as culpas do
atraso estrutural que cada vez mais nos caracteriza, da inércia
governativa instalada, dos índices vergonhosos que nos afundam nas
tabelas de desenvolvimento e querem agora fazer-nos crer que serão eles
a salvar-nos? E depois de quatro anos de bloco central, para cima de
quem atirariam a responsabilidade da má governação? Por mais que os
cartoonistas, humoristas e a generalidade dos comentadores se regozijem
com a ideia de Sócrates e Manuela a passear de mãos dadas por São
bento, o país não pode aceitar este cenário aterrador de ânimo leve.
Afinal de contas, isto é porreiro para quem pá?
Texto de Daniel Nicola
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