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DO RACISMO NA ASSEMBLEIA MUNICIPAL DE VISEU À XENOFOBIA DO CARDEAL PATRIARCA DE LISBOA
29-Jan-2009
Fui assistir à última reunião da Assembleia
Municipal de Viseu, que teve lugar em 29 de Dezembro. Sabia que a deputada do
Bloco de Esquerda levaria àquele órgão autárquico o caso de uma família de
etnia cigana que vive há anos num rés-do-chão de uma habitação na Travessa do
Matadouro, transversal à Rua de Serpa Pinto, que uma técnica da Câmara
caracterizou com toda a propriedade, como uma “loja de animais” (efectivamente
ainda se lá encontram as argolas onde se prendiam os burros), conforme o núcleo
de Viseu da Associação Olho Vivo tem vindo a denunciar desde há mais de um ano
neste jornal, na rubrica “Golpe de Vista”. Foi, aliás, uma sessão em que o
Bloco de Esquerda, apesar de ter apenas uma deputada municipal, fez a diferença
ao apresentar soluções concretas para resolver problemas que afectam os
munícipes. A moção sobre a criação por parte da Câmara de um Gabinete de Crise
de atendimento público com o intuito de proceder ao levantamento das situações
de pobreza e exclusão social, endividamento das famílias e das pequenas e
médias empresas, tendo em conta a multiplicação das situações de pobreza provocadas
pela crise actual, foi reprovada pelo PSD por considerar que a CMV já tinha
previsto medidas para a crise, como seja o refeitório social e o congelamento
das rendas de habitação social. Curiosamente, hoje mesmo ouvi, na Rádio NoAr, o
deputado municipal do PSD, António Vicente, a valorizar aquelas medidas da
autarquia viseenses, mas defendendo um estudo mais aprofundado nas freguesias
limítrofes do concelho, de modo a se perceber a verdadeira dimensão da pobreza
no concelho de Viseu. Exactamente como sugerira o BE.
As outras duas moções
apresentadas pelo BE foram aprovadas: uma manifestando a solidariedade da
Assembleia Municipal com a luta dos professores por um modelo de avaliação
justo e pela dignificação da carreira docente; e outra sobre a Universidade
Pública em Viseu, defendendo como “a melhor solução para defender os interesses
da região e do país, a transformação do Instituto Politécnico de Viseu numa
Universidade Politécnica, de forma a poder desenvolver plenamente todas as
potencialidades das suas escolas, incluindo a Escola Superior de Saúde, tão
desvalorizada face às necessidades do País”.
Coube
ainda à deputada Graça Marques Pinto a intervenção mais dura contra o projecto
de regulamento de propaganda partidária, apresentado por Fernando Ruas, que
mais não visava do que cercear a liberdade de expressão e o direito de
propaganda política, sujeitando-o ao critério, subjectivo e discricionário, de “não
afectar a estética”, na sequência,
aliás, da queixa crime que a CMV teve a indignidade de apresentar contra dois
jovens militantes do PCP, mandados identificar quando efectuavam uma pintura
mural no viaduto junto ao Hospital, local que sempre foi utilizado para afixar
propaganda política. A oposição dos deputados do PS que defenderam que o
regulamento fosse alterado de modo a beneficiar do consenso de todos os partidos,
e até as reservas de Hélder Amaral, do CDS, levaram Fernando Ruas a propor a
retirada da proposta, adiando a votação do regulamento para a AM de Fevereiro.
Fernando
Ruas, depois da deputada do Bloco de Esquerda o ter interpelado acerca da discriminação
de munícipes de etnia cigana com a política de habitação social do seu
executivo, afirmou que a autarquia já tinha oferecido um T2 à família a viver
no estábulo, que teria recusado. Foi então que decidi inscrever-me para falar
no período reservado ao público.
Conforme eu disse na
minha intervenção, a
familia de etnica cigana tinha-me garantido que não recebera qualquer
oferta de casa por parte da CMV. Depois de sair da Assembleia Municipal voltei
a contacta-los, a António Fernandes Pinto e sua mãe, Silvina Pinto que me
reafirmaram sob sua palavra de honra, que o presidente estava a mentir uma vez
que nunca receberam qualquer oferta de habitação social. Não tenho nenhum motivo
para não acreditar na palavra de António Pinto; conheço-o há muitos anos e
nunca me mentiu. Já quanto a Fernando Ruas, ouvi-o mentir em plena Assembleia
Municipal quando em resposta à deputada do Bloco de Esquerda
que o interpelara sobre problemas denunciados por alguns moradores do Bairro
Social da Quinta da Pomba, a acusou de não conhecer os bairros, de contrário
saberia que aquele até já tinha ganho um prémio e que tem tanta qualidade que
todas as casas têm lareira. Ora, a verdade é que só um dos blocos é que tem
lareiras. Fernando Ruas não mentiu deliberadamente; foi traído pela ignorância
da realidade. Só visitou o bloco que inaugurou. É provável que no caso
vertente, também tenha sido mal informado por algum funcionário ou vereador.
Além do mais, não me parece que um
T2 fosse resolver, da forma mais adequada, as necessidades de habitação de uma
família, com um casal, um filho de quatro anos e uma avó, sabendo nós que as
casas de habitação social já têm os
compartimentos muito mais pequenos do que o permitido por lei para uma
habitação"normal"? Será que as crianças ciganas não têm direito a um
quarto só para si?
Aquando da inauguração do Bairro
Social da Quinta da Pomba, o senhor presidente da CMV afirmou que aquele iria
ser "um bairro muito digno" por já não ter
os "constrangimentos sociais" que teve com o bairro de Paradinha.
Hoje, ao
verificar que não mora ali um único munícipe de etnia cigana, somos levados a
não ter dúvidas sobre a tradução de "constrangimentos sociais"
como "realojamento de ciganos". A isto chama-se "racismo
institucional". Os ciganos do Bairro de
Paradinha acusam a CMV de estar a levar a uma espécie de "limpeza
étnica", transferindo moradores de uns blocos para outros, de
modo a ficarem blocos só para ciganos e outros para "caras-pálidas".
É por esta e por outras que muitos ciganos, incluindo Silvina Pinto, manifestam
relutância em ir morar para o Bairro de Paradinha, por ser um autêntico “gueto”
de ciganos.
Na Assembleia Municipal não tive
tempo para me referir à intervenção do presidente da Junta de S. João de Lourosa,
António Fonseca, do PSD, que em defesa da Câmara, proferiu um arrazoado de
imprecações racistas, inadmissíveis numa autarquia democrática, dizendo que os
ciganos não querem trabalhar, destroem as casas todas, que não são tão pobres
como parecem, já que recebem o Rendimento de Inserção Social e ainda trabalham,
“como não sei”...
Pior só mesmo a tirada xenófoba do
Cardeal Patriarca de Lisboa aconselhando as católicas a pensarem bem antes de
casarem com um muçulmano, para não se meterem num “monte de sarilhos”. Num país
como Portugal, onde são assassinadas 40 mulheres por ano, pelos maridos,
companheiros, namorados ou ex-companheiros, vem um representante de uma das
Igrejas mais preconceituosas e retrógradas da história das religiões, e uma das
que mais discrimina as mulheres, apontar o cisco nos olhos dos outros. Não me
lembro de o ter ouvido chamar a atenção, publicamente, do reitor do Santuário
de Fátima, Luciano Guerra, quando numa entrevista ao DN de 13.10.2007, afirmou
que uma mulher agredida pelo marido, não todas as semanas, mas que só leva um
soco de 3 em 3 anos, sendo amada no resto do tempo, não se deveria divorciar.
Qual é a diferença entre este bispo católico e o clérigo muçulmano que ensinava
numa televisão do Bahrein como se deve bater numa mulher (nunca em frente dos
filhos, sem causar feridas nem sangue, não bater na cara, etc.)?
E se fossem todos, ecumenicamente,
para o diabo que os carregue?